quinta-feira, 26 de junho de 2008

Relato de D. Julián Herranz sobre a ida para o céu S. Josemaria em 26 de Junho de 1975

Nesse 26 de Junho regressei do Vaticano a Villa Tevere à hora habitual, pouco antes da uma e meia. Mal cheguei, a Secretaria Geral avisou-me: - Suba rapidamente. O Padre está a morrer.
O meu coração estremeceu e, a rezar, subi rapidamente.

Quando cheguei ao segundo andar de Villa Vecchia, D. Álvaro, que nesse momento se encontrava na porta do seu gabinete de trabalho, onde jazia o Padre, disse-me:— Vem, vem, porque tu também és médico.Entrei imediatamente e encontrei o Padre de sotaina, estendido no chão, com o rosto sereno, embora sem respirar.

José Luis Soria, sacerdote e médico, estava a fazer-lhe respiração artificial há algum tempo. Fomo-nos alternando, uns segundos ele e outros eu. Continuámos a fazer-lhe também massagem cardíaca. Eu não sabia o que tinha sucedido, embora supusesse, como depois me informaram, que o Padre tinha sofrido um ataque cardíaco. Aceitei a Vontade de Deus, mas pedía-Lhe que não o levasse tão depressa. De joelhos como estava, pedi com toda a minha alma ao Senhor que aceitasse uma troca, a minha vida pela sua. A minha vale pouco, disse-Lhe. A sua é-nos necessária a todos, aos seus filhos, à Igreja, à humanidade.E assim estivemos o José Luis e eu, durante longo tempo, uma vez e outra e outra... em silêncio, com as lágrimas nos olhos, até que verificámos que era inútil continuar. Todos os sinais clínicos eram de morte.

D. Álvaro e Javier Echevarría, que em todos os momentos tinham acompanhado e atendido amorosamente o Padre, comunicaram formalmente a tristíssima notícia aos membros do Conselho Geral que estavam reunidos numa sala contígua. Também se comunicou, telefonicamente, às mulheres da Assessoria Central. Em ambos os casos, dando-lhes também os conselhos oportunos de piedade filial e de governo.


Trasladámos a seguir o corpo do Padre para o oratório de Santa Maria da Paz.
Horas depois, enquanto rezava diante o seu corpo, vestido com paramentos sacerdotais, veio-me à mente, dentre outras muitas entranháveis recordações, a confidência que o Padre nos tinha feito num longínquo dia de Natal de 1953, junto à lareira da sala de estar. Disse-nos que queria escrever um livro sobre o burrico, esse animal bíblico com que tanto gostava de se identificar, porque tinha dado calor a Jesus em Belém e tinha-O levado em triunfo a Jerusalém. Um animal que os homens não costumam estimar muito mas o Padre apresentava-o como exemplo de humildade, de rijeza no trabalho e de fidelidade nessa guerra de paz e de amor que os seus filhos do Opus Dei e todos os cristãos estão chamados a propagar no mundo. Se chegasse a ter tempo para escrever esse livro — disse-nos — dava-lhe o título Vida e ventura de um burrico de nora.

Deus levou-o antes que o pudesse completar. Mas conservam-se passagens recolhidas das suas conversas, algumas das quais, corrigidas pelo seu próprio punho e letra, glosam as misericórdias do oratório de Pentecostes que ele quis ornamentar com cenas de burricos.

Esses textos – recolhidos em Crónica, uma revista interna – são um símbolo da sua vida. Entre outras maravilhas da “teologia do burrico”, lê-se:«Teria agradado ao burrico chegar ao Natal; aquecer outra vez, com o seu bafo, o Menino. Mas esteve de algum modo presente, na branca alegria daquela noite, porque vieram os anjos e fizeram da sua pele pandeiretas e roncas.«A história do burrico termina bem, morre a trabalhar. E que o despedacem depois, que lhe tirem a pele e façam tambores para a guerra e roncas para cantar ao Menino Deus».

Assim morreu o Padre.
Do site do Opus Dei

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